Como o "Assustador" me ensinou a ter medo de fantasmas

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ANTES


 Minhas primas e minha irmã sempre foram mais corajosas que eu, ou talvez olhando daqui do futuro; menos responsáveis. E a maior prova era a facilidade delas em assistir filmes de terror de madrugada. Na verdade, elas assistiam com a luz acessa, no mudo e com a mão na frente. Eu nunca cheguei a ver esse filme ( eu nunca vi filme de terror nenhum), mas lá pelos meus 12 anos, O Chamado fazia um baita sucesso e botava medo em todo mundo. A diversão era assistir O Chamado...de luz acessa, com a mão na frente e no mudo. 
Mas como as três eram muito curiosas, isso não era o suficiente. Foi quando achamos um site que mostrava fotos e histórias de aparições de espíritos, além de acidentes famosos de avião e alguns "passo a passo" para aquelas brincadeira saudavelmente demoníacas do copo e do compasso.
A gente se sentava as quatro de frente pro computador, daqueles brancos enormes, que ficava em cima de uma escrivaninha com tampo de vidro, do lado da porta de entrada e de baixo da janela que dava pra rua. Não sei bem porque, mas essas bobeiras sempre aconteciam lá pro finalzinho da tarde e quando acabava já era noite e o medo era grande demais para que a gente conseguisse andar numa boa pela casa. Ou alguém gritava e todo mundo saía correndo assustado, ou um adulto aparecia e mandava a gente pro quarto.
Um dia nós tivemos a certeza do nível da nossa falta do que fazer. Acessamos o assustador.com e começamos a ler em voz alta a história de uma menina que morreu queimada na própria casa e que depois a alma dela virou fumaça, e tinha uma foto da fumaça. (Que nem de longe parecia um rosto, mas pra mente de quatro crianças tá valendo). Decidimos ousar e fomos para as fotos. Não durou muito. A essa altura eu já não me lembro que foto foi aquela, deve ter sido tão traumatizante que meu cérebro apagou, mas nós quatro gritamos juntas e tampamos nossos olhos com as duas mãos. Passamos meia hora discutindo quem ia destampar os olhos para desligar o computador. - DESLIGUEI ...DESLIGUEI O COMPUTADOR. - A Ana tinha gritado e em um segundo a sala se livrou do barulhão do CPU funcionando.  A tela estava preta outra vez, mas a imagem do assustador fez nós quatro termos pesadelos a noite toda.
Não ligamos o computador pelo resto do fim de semana.  Não falamos sobre fantasmas e deixamos acesas todas as luzes da casa. 
É claro que no final de semana seguinte nós fizemos de novo. Levamos mais um susto, alimentamos nosso medo e nos tornamos adultas com uma total incapacidade de lidar com o escuro. Antes disso, antes de O chamado, as referências aos fantasmas eram poucas, não assustavam o bastante. 
Anos depois, minha prima mais nova começou com umas histórias de que ela ouvia coisas estranhas pela casa, de repente estavam todos falando sobre espíritos. 
A morte nunca mais deixou de ser um assunto no meu subconsciente. Eu sempre levei esses questionamentos pra minha vida. A Amora dos meus 12 anos sentia uma escuridão terrível no peito quando pensava no assunto, saia abraçando todo mundo, dizendo que amava, ficava realmente perturbada. 
Eu vivi inúmeras situações bizarras com minhas primas e minha irmã, mas essa em particular despertou em mim um tipo de pensamento que as outra passagens não trouxeram a tona. 
Acho que esse foi o começo de toda a brisação que acontece na minha cabeça.

*A Amora tem repensando toda a sua vida desde que ela foi parar na delegacia depois de um (pequeno) surto. Você pode acompanhar suas outras histórias se clicar em "história 1" aqui do lado. 

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